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Nada vai bem em ‘Tudo Vai Ficar Bem’

Nem toda história de homem em crise é boa.

Existe uma diferença entre filmes ruins e filmes chatos. Dá para se divertir num domingo à noite vendo uma comédia ruim na televisão, por exemplo. Talvez você não recomende pra ninguém ou prefira dizer que passou o fim de semana vendo “O Poderoso Chefão” caso te perguntem, mas não quer dizer que tenha sido chato. E existem filmes que são bons, mas não muito legais. Você pode dizer orgulhoso numa roda de amigos que viu, gostou, mas no fundo sabe que não veria de novo. “Tudo Vai Ficar Bem”, de Wim Wenders, é um dos infelizes filmes que combinam as duas características.

É mais uma história de um homem jovem, branco, em crise. No filme, que estreou na quinta (10), James Franco é Tomas, um escritor com bloqueio criativo, sofrendo para escrever duas páginas depois de ter lançado dois romances. O relacionamento com Sara (Rachel McAdams) também vai mal, mas não sabemos muito bem o porquê. A questão, diz ele, é que eles têm planos incompatíveis: ela quer ter filhos e ele quer escrever. A verdade é que ele é, vamos usar um eufemismo, difícil. Enquanto ela quer investir no relacionamento ele ignora seus telefonemas e qualquer tentativa de aproximação. Quando ela o pressiona, ele diz platitudes (como seu pai, mais tarde, aponta sabiamente) do estilo “não é você, sou eu”.

Voltando para casa um dia num dia com neve, Tomas não vê duas crianças que cruzam a estrada num trenó e atropela uma delas. A mãe dos meninos (Charlotte Gainsbourg) não o culpa: trata-se de um acidente, ela diz, a culpa foi dela que não colocou as crianças para dentro de casa porque não conseguia largar um livro. Depois disso, não há grandes acontecimentos. Tomas não consegue se esquecer do acidente, ele entra numa espiral rumo ao fundo do poço, termina o namoro, mas sua carreira decola (em um momento, o acusam de ter usado os acontecimentos daquele dia fatídico como inspiração).

Rachel McAdams, coitada, não tem muito com o que trabalhar e faz o melhor possível com o papel, apesar de ter um sotaque esquisitíssimo. James Franco mal consegue manter os olhos abertos, parecendo estar eternamente chapado. Charlotte Gainsbourg chora, reza ou murmura o tempo todo. Mas o pior é a edição: depois de uma cena (que acrescenta pouco, diga-se de passagem) de conversa entre Tomas e o pai, por exemplo, pode vir uma da personagem de Charlotte (tão mal desenvolvida que tive que olhar no IMDb seu nome: Kate) passeando com seu cachorro. Por que motivo? Não sabemos. É uma sucessão de cenas aleatórias e as transições são tão bruscas, com tanto fade-out, que em diversos momentos você acha que o filme acabou.

Vários saltos de tempo são dados, também sem sutileza. Um letreiro avisa que passaram-se dois anos, depois quatro, depois mais quatro. Mas em mais de uma década de história nada de interessante acontece, Tomas continua o mesmo, só ganha uma nova namorada — mais uma personagem fraca, que pelo menos tem uma filha interessante. Mais para o final parece que a história vai virar um suspense (a trilha sonora sinistra ajuda a passar essa impressão), mas isso também não evolui muito. Embora o filme tenha uma cara própria, o que é bom, e uma premissa que poderia ser interessante, ele nunca deslancha. Nem toda história de homem em crise é boa. Nem todo homem “difícil” é interessante ou profundo. Às vezes ele é só chato mesmo.

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