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O mistério de ‘Rua Cloverfield, 10’

Filme mostra que às vezes marketing nenhum é melhor que muito marketing.

Em tempos de trailers super revelatórios, que contam a história do começo ao fim, e notícias do set publicadas muito antes de os filmes estrearem, o mistério em torno de “Rua Cloverfield, 10” é espantoso. Só se soube que o longa produzido por J.J. Abrams e gravado com diferentes nomes falsos estava sendo feito poucos meses antes de chegar ao cinema. Seu trailer, lançado em janeiro, também é bem vago e mostra o clima do filme — que estreia hoje (7) no Brasil — sem revelar quase nada da história. É ótimo: esse é um dos casos em que quanto menos se sabe da trama, melhor (por isso, o texto não conta nada que vá estragar a experiência de alguém e fala o mínimo possível sobre a história — apesar de falar um pouco sobre a história).

Nas cenas iniciais, Michelle (Mary Elizabeth Winstead) arruma as malas e pega o carro, fugindo do namorado. Após sofrer um acidente na estrada, acorda numa casa desconhecida, acompanhada de Howard (John Goodman), dono do lugar, e Emmett (John Gallagher Jr.), vizinho dele. Howard diz a Michelle que enquanto ela estava desacordada houve um ataque no local — possivelmente de extraterrestres, talvez de inimigos dos Estados Unidos, químico ou nuclear, ele não sabe bem –, que todo o mundo morreu e que o ar fora daquele lugar, um bunker construído por ele, está tóxico. Em um ou dois anos eles podem sair de lá, mas por enquanto ninguém sai, avisa ele. Michelle fica confusa, e Howard não ajuda muito — se você quer que alguém se sinta seguro acorrentar a pessoa na parede e mostrar o revólver no seu bolso não é a melhor das estratégias.

Como Michelle, o espectador não sabe o que de fato aconteceu e nem quem são aquelas pessoas. Howard pode tanto ser um visionário que salvou sua vida quanto um psicopata mentiroso. E John Goodman, com sua cara bonachona, é 100% assustador mesmo quando Howard tenta ser fofo colocando músicas alegres e oferecendo sorvete aos companheiros. Ainda que haja alguns momentos de paz — como mostra o trailer, em cenas com os três habitantes do bunker jogando jogos de tabuleiro ou vendo filmes –, o roteiro de Josh Campbell, Matthew Stuecken e Damien Chazelle (de “Whiplash”) evolui devagar e mantém a tensão no ar no tempo inteiro — com um trecho de mais ou menos meia hora tensíssimo, de fazer gente mais suscetível a isso pular da cadeira algumas vezes.

Como a lista de personagens que aparecem em cena pode ser contada nos dedos de uma mão e o cenário varia pouquíssimo (“O Quarto de Jack” e “The Wolfpack”, pra ficar em filmes sobre pessoas enclausuradas, têm bem mais diversidade de paisagens que “Rua Cloverfield, 10”), se o elenco não fosse bom e as personalidades de cada um não fossem bem construídas, as chances de o filme dar errado seriam grandes. Felizmente, não é o caso. Michelle, aliás, é uma mocinha de filme de suspense das mais inteligentes e Mary Elizabeth Winstead merece receber mais papéis de destaque por aí. Independente do que ele diz ser verdade ou não, Howard é bem doido e Emmett, o personagem menor da história, é o bonitinho simpático — ter um desses no filme costuma cair bem.

Mais que isso, infelizmente, não dá pra contar. Mas é quase refrescante ir ao cinema sem saber quase nada sobre o filme. A equipe de “Rua Cloverfield, 10” mostra que, às vezes, a melhor campanha de marketing possível é fazer a menor campanha que der.

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