Categorias
Comportamento

A festa dos animais no Instagram

Bob comemora seu aniversário de dois anos numa tarde de domingo nos Jardins, em São Paulo. Para driblar o calor de mais de 30 graus, serve aos convidados — emperiquitados com lacinhos, lenços coloridos e vestidos de bailarina — picolés de cenoura ou maçã com banana. A festa está cheia, mas Bob brinca sozinho desde que um amigo grandão e levemente invocado rosnou e lhe mostrou os dentes. Um detalhe importante: Bob é um cachorro, assim como a maioria de seus convidados.

É uma festa inusitada e, em alguns momentos, surreal. “Esse brigadeiro é pra gente, não pra cachorro, tá?”, esclarece uma vendedora de doces. A explicação é necessária, já que a maior parte das barraquinhas da festa tem animais como público-alvo. Shampoo, condicionador, roupinhas, biscoitos, cerveja (sem álcool e sem gás) e uma mesa de quitutes formam do cardápio de produtos para cachorros.

“Esse é o Bob?”, pergunta uma mulher ao chegar, com seu cachorro na coleira, para o dono de um dos vários golden retrievers — raça do aniversariante — por ali. “Não, esse é o Bowie”, responde ele, chamando o cachorro que brinca com Lennon e Elvis (“Só cantores aqui!”, comenta uma moça, empolgada) e, minutos depois, devora um picolé canino com palito e tudo. Quase ninguém ali conhece o dono da festa pessoalmente, mas mesmo assim dezenas de pessoas pagaram R$ 22 por cabeça (com direito a dois cachorros por convite), para lhe dar parabéns e entregar presentes.

festa-dog-bob-golden-10

Bob, é bom explicar, não é só um cachorro. É um cachorro celebridade no Instagram, com mais de 210 mil seguidores. Boa parte dos outros cães na festa, aliás, tem seus próprios perfis nas redes sociais. Para facilitar a vida dos convidados, quase todos os goldens usavam bandanas com seu nome. Uma busca pelo nome do animal com a palavra golden no Google revela todos os perfis: Chandon (6.155 seguidores), Mell e Reiki (21,7 mil), Hanna (5.035), Google (15,8 mil), Marley (15,3 mil) e por aí vai. Todos admiradores de Bob, o mais bem-sucedido da turma.

O cachorro ganhou fama posando com um hamster e passarinhos que vivem em sua casa. Suas fotos fofas chamaram a atenção de sites como Buzzfeed, Daily Mail, USA Today e Huffington Post em países como Itália, Estados Unidos, e Inglaterra. As matérias lá fora ajudaram a catapultar o número de fãs. Em junho, Bob tinha perto de 50 mil seguidores. No mês seguinte, passou a barreira dos 100 mil. Pouco tempo depois, passou dos 200 mil.

Em julho, fez sua primeira festa. Por R$ 50 (R$ 20 consumíveis) era possível levar um cão para brincar, participar de um concurso de fantasia, “degustar comidinhas pets”, concorrer a prêmios e conhecer Bob pessoalmente. Segundo seu dono, Luiz Higa Júnior, havia mais gente na festa julina do que no aniversário. E mesmo na comemoração dos dois anos de Bob o espaço estava bem cheio. Todas as tentativas de contar o número de cachorros presentes, porém, falharam (experimente contar uma matilha de golden retrievers correndo um atrás do outro).

festa-dog-bob-golden-43

Bob tem também um lado empresário: é parceiro de algumas lojas de produtos para cachorro, que anuncia em seu perfil. Entrando no site das lojas e usando um cupom Bob (só escrever o nome do cão no campo de promoções) há um desconto em produtos. Em contrapartida, as lojas às vezes aparecem no perfil do cachorro e expunham no seu aniversário. A tal cerveja canina é um exemplo. “O esquenta aqui em casa foi dos bons!!!! E… Estamos bêbassos”, diz o post em que o cão aparece ao lado da garrafa. O perfil ainda dá dicas de hotéis para cachorro, marcas de ração e restaurantes e padarias que recebem animais.

A figura “Bob Golden Retriever” nasceu meio por acaso. O Luiz participava de um grupo de fãs de golden no Facebook, em que todos postavam fotos de seus cachorros, e começou a fazer o mesmo. “Já tinha os passarinhos, comecei a soltar e colocar para tirar fotos juntos. Todo o mundo gostava. Pra não ficar muito maçante, todo o dia postando foto dele lá, resolvi criar um perfil no Instagram”, conta. “Estou numa época agora meio sem tempo, por causa do trabalho. Não estou conseguindo fazer tantas fotos. Mas tento atualizar todo dia, com pelo menos uma.”

festa-dog-bob-golden-48

CICLO SEM FIM

O aniversário de Bob é um reflexo de como funciona o mundo dos perfis de animais no Instagram. Escolha um ao acaso. Leia os comentários. Clique em algum deles. A probabilidade de ser outro perfil de animal é alta, já que muitos se conhecem e interagem com os outros. Repita o procedimento. É um ciclo sem fim.

No meio dessa multidão, alguns se destacam e chegam ao status de super celebridade. É o caso da cadelinha americana Marnie, que tem a cabeça virada para o lado, a língua de fora, 1,7 milhão de fãs no Instagram e mais fotos com famosos do que a Kim Kardashian (Lena Dunham, Tina Fey, James Franco e Miley Cyrus já posaram com ela). Um de seus “amigos” é o Tuna, cão retrognata — que tem a mandíbula retraída — seguido por 1,5 milhão de perfis. É uma versão em escala maior do que acontece no Brasil, com animais posando no perfil um do outro e “conversando” pelas redes sociais como se fossem gente.

marnie1

O próprio Instagram fez, no ano passado, um calendário de 2015 só com imagens de seus perfis de animais. E, para os donos, os bichos podem ser uma mina de ouro. Neste mês, a designer gráfica Leslie Mosier publicou um texto no Huffington Post dizendo que tinha largado o emprego para ser empresária de seu pug, Doug, que tem 716 mil seguidores no Instagram.

Leslie comprou Doug em 2012 e começou a publicar fotos dele em seu próprio perfil. Logo percebeu que as imagens do cachorro eram mais curtidas que as outras e passou a investir nele: fez montagens, deu várias fantasias, caprichou nas legendas. As fotos de Doug passaram a ser compartilhadas por outros perfis de cachorro e ela aproveitou o embalo para criar uma conta própria para o cão.

Em pouco tempo Doug ganhou a mídia. Primeiro apareceu no site Mashable, depois em uma série de outros, até chegar à televisão americana. Um vídeo que fez numa festa para comemorar a marca de 100 mil seguidores estourou e teve mais de 20 milhões de visualizações. Foi aí que Leslie decidiu fazer do cachorro seu ganha-pão. “Por mais que tenha sido uma decisão dura, não foi difícil perceber que construir a marca Doug the Pug era uma oportunidade única na vida”, escreveu Leslie. “Com o apoio dos meus pais e amigos, tomei uma das decisões mais difíceis e mais gratificantes da vida, abrindo mão da segurança de um salário mensal.”

As publicitárias Amanda Nori e Stéfany Guimarães seguiram o mesmo caminho, segundo contaram à Folha — tentamos falar com elas mais de uma vez para fazer uma entrevista, sem retorno. Donas do gato Chico, montaram a página Cansei de Ser Gato (342 mil fãs no Facebook e 115 mil no Instagram), com imagens de um felino blasé encarnando vários personagens.

Devido ao sucesso do gato, pediram demissão de seus empregos. Desde então, Chico já protagonizou mais de 70 campanhas publicitárias. Fora isso, as duas abriram uma loja virtual com fantasias para gatos, roupas para seus donos e objetos como almofadas e canecas. Fizeram também um livro com fotos do animal e planejam outro: uma biografia. “Chico é um influenciador da internet”, disse Stéfany ao jornal.

OS VÁRIOS PORQUINHOS

Nem só de “dog people” e “cat people” vive o Instagram. Outro animal tão popular quanto cães e gatos é o porco (confissão: eu mesma sigo quatro perfis). No Brasil, o mais célebre é Jamon (361 mil curtidas no Facebook e 58,8 mil no Instagram), da publicitária Dea Mendes. O porquinho foi seu presente de Dia dos Namorados em 2013. Ela queria um animal que vivesse mais que um cachorro, mas que agisse mais ou menos como um deles e pudesse ser criado em casa.

Segundo a Dea, o porco — que mais tarde ganhou um companheiro, Nero — é pacato, esperto e carinhoso. “Os dois até adotaram dois gatos da rua, que dormem na casa com eles. Meu marido tem certeza que eu adotei, mãs não foi!”, ela conta. Tamanha simpatia fez com que Dea postasse sem parar fotos de seu porco em seus próprios perfis. “Parecia mãe de primeira viagem. Vi o quanto às vezes aquilo me irritava nos outros, então poderia (e devia) estar irritando meus amigos.” Fez, então, um perfil para Jamon, entre junho e julho de 2013.

jamon2

Poucos meses depois, em setembro, o perfil oficial do Instagram recomendou Jamon como um animal a ser curtido e lhe deu a hashtag #weeklyfluff (algo como o fofinho da semana). “Era a primeira vez que um ‘pig’ figurava na sugestão semanal deles”, conta Dea. “Chegamos a sair na [revista] ‘Wired’ para contar quem estava por trás do Jamon. Foi uma conquista incrível.” A partir da recomendação do Instagram o número de seguidores cresceu, assim como o espaço na mídia, que gerou mais seguidores, que gerou mais espaço na mídia… E por aí foi.

As fotos de Jamon são, basicamente, fofas. O porco veste chapéu de pirata, sai do banho enrolado numa toalha, tem roupinhas personalizadas e fica uma graça de peruca. Antecipando a popularidade suína em 2010, o personagem da série “How I Met Your Mother” Barney Stinson (também nome de um cachorro no Instagram, vale ressaltar) cravou: é impossível não se derreter por um miniporco.

UM CÃO CHAMADO JIMMY

O animal brasileiro mais interessante do Instagram, possivelmente, é o mais diferente do grupo: o bull terrier Jimmy Choo. Suas fotos não estão expostas num perfil próprio, e sim no do seu dono, o artista Rafael Mantesso. Muitas vezes não há legendas, ele não “conversa” com outros cachorros e, embora Jimmy seja bonito, sua fofura no dia a dia não é o principal atrativo das imagens.

Nas fotos tiradas pelo Rafael, o Jimmy aparece sempre num fundo branco, quase sempre interagindo com desenhos do dono. Tem Jimmy num tapete voador, sendo engolido por um jacaré, mostrando a língua ao lado do Calvin e do Haroldo. De vez em quando há objetos envolvidos, e é surpreendente como o cachorro é tão calmo quanto expressivo. Questionado sobre como fez para tirar uma foto em que Jimmy aparece de toalha enrolada na cabeça e uma rodela de pepino sobre o olho, Rafael responde como se fosse óbvio (quem tem cachorro sabe: não é): “Coloquei a toalha na cabeça dele, um pepino no olho, e cliquei”.

Jimmy foi comprado em 2009, quando o Rafael se casou. Ele queria um bull terrier, ela topou. Foram a um canil e a criadora tentou convencê-los a levar um macho mais forte, maior. Rafael quis Jimmy, o branquinho que foi brincar com ele assim que tinha chegado. Todos os filhotes tinham nome de um X-Men. “Ele ganhou o pior possível, o X-Men mais desconhecido: Fortão”, conta Rafael. “Óbvio que minha ex-mulher não gostou. Ela já tinha na cabeça o nome da marca de sapatos de que ela mais gostava. Ela era estudante de moda e oriental, por isso o apreço pela Jimmy Choo.” O destino cool do cão (chamado, no pedigree, de Jimmy Choo Fortão Di Maredella — o último nome é o do canil) estava mais ou menos traçado.

jimmy2

Rafael começou seu instagram como um canal de um blog de gastronomia que tinha na época. Postava principalmente desenhos e brincadeiras que fazia com comida e brinquedos, mas as pessoas não acreditavam que o conteúdo era dele. “Achavam que era montagem ou coisa que eu pegava da internet. Daí vez ou outra eu postava fotos do meu cachorro pra mostrar que aquele perfil era de um cara de verdade.”

Quando se separou da mulher, ficou com o apartamento, vazio, e o cachorro. “Decidi não morar mais lá, mas até vender o apartamento eu não queria comprar móveis”, diz. “Não teria móveis, mas teria telas e desenhos. Teria vida e teria a minha cara.” Começou fazendo fotos do cachorro em poses mais básicas, entre suas pernas ou vestindo suas botas. “Um dia comprei uma lixeira e desenhei um esqueleto na caixa. Coloquei o Jimmy atrás e fotografei, como se fosse um raio-x dele. A ideia nasceu aí. Ia desenhar nas minhas paredes e no meu chão e fotografar com o Jimmy do lado ou em frente.”

Cada foto tem uma história, diz. Às vezes desenha o cenário antes e coloca o cachorro nele só na hora de tirar a foto, às vezes desenha depois. O cão topa tudo. “O Jimmy é especial. Ele fica exatamente na posição que eu quero, pelo tempo que eu precisar”, afirma. “Ele sabe que eu preciso dele naquela posição e que não vou desrespeitá-lo, não vou constrangê-lo, não vou fazer nada de ruim com ele. Ele sabe que é importante pra mim e simplesmente fica.”

Há um ano Jimmy ficou famoso internacionalmente. “Em uma semana os principais portais e veículos do mundo todo descobriram meu Instagram e postaram a respeito. Passei de 20 mil seguidores para 100 mil em duas semanas. Daí em diante não parou mais. É meio orgânico. Uma pessoa segue, marca um amigo, que segue e marca outro amigo…” Hoje são mais de 387 mil.

As fotos do cachorro já viraram até livro, chamado “A Dog Named Jimmy” e vendido na Amazon por US$ 11,73. Os convites para publicação começaram já no ano passado. Rafael contratou um agente literário, que fez uma oferta de livro para dez editoras. Todas quiseram e ele fechou com a Penguin. “Lancei o livro lá fora primeiro porque, como tudo no Brasil, as coisas só têm valor aqui quando vêm lá de fora”, diz. Na Amazon, o livro está no topo na lista de mais vendidos com o tema cachorros. A versão brasileira será lançada pela editora Intrínseca.

Jimmy foi convidado para ir a Londres, para fotografar para um editorial de moda. Rafael não quis, mas a marca fez outra oferta: de estampar uma linha de produtos. “Fiquei muito honrado e caí em cima. O resultado ficou incrível e a coleção esgotou antes do que eles previam.” Jimmy talvez seja menos pop star que o aniversariante Bob, mas é modelo de alta costura. Tem celebridades animais para todos os gostos.

Categorias
Comportamento

A febre do ‘unboxing’ para crianças

Desde março do ano passado, uma resolução do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) considera abusiva toda publicidade dirigida a crianças. Na TV aberta, os efeitos foram sentidos: sem poder fazer propaganda e com maior dificuldade para vender anúncios, os canais escantearam a programação infantil. Enquanto os olhos se voltavam para a televisão, porém, algo aconteceu na internet.

Entre os vídeos mais populares no YouTube estão aqueles em que pessoas tiram produtos de suas caixas e mostram todos os seus detalhes, do plástico utilizado ao posicionamento do código de barras. Pode ser qualquer coisa, de um celular novo a um chocolate, um DVD. Normalmente, são produtos novos, recém-lançados, o que dá um ar de exclusividade. É uma febre. Os mais populares atualmente, porém, são os de brinquedos, voltados para o público infantil. Não é a publicidade tradicional, mas organizações e grupos de pais argumentam que se trata, sim, de propaganda para crianças.

Segundo dados do Google, a popularidade dos vídeos de “unboxing” cresceu em 57% no ano passado. Em números de vídeos enviados, o aumento foi de 50%. Uma busca no YouTube por “unboxing” resulta em mais de 20 milhões de vídeos — isso apenas com a palavra em inglês. Para ver tudo, seria preciso passar sete anos em frente ao computador. Em 2014, esse conteúdo ultrapassou 1 bilhão de visualizações no YouTube — e o Google diz que 20% de seus usuários já viu um vídeo do gênero.

Nas palavras da empresa, “esses vídeos não apenas documentam a experiência de abrir um produto, mas também frequentemente a dramatizam e, assim, adquirem um espírito brincalhão, mostrando os produtos recém-abertos em toda a sua glória”.

Em suas pesquisas para decifrar a popularidade do conteúdo, o Google concluiu que seu principal atrativo é dar ao espectador a sensação de antecipação infantil que se tem, por exemplo, ao ver uma árvore de Natal cheia de presentes embalados. Não por acaso, as visualizações aumentam no fim do ano.

Combinado a isso está o fato de que ver alguém abrindo a caixa ajuda na hora de decidir se vale a pena ou não comprar o tal produto. Pelo menos em se tratando de adultos, portanto, o Google reconhece que há um aspecto comercial ali, sim.

Embora existam vídeos de “unboxing” para todos os públicos, o maior canal do gênero é direcionado para bebês e crianças em fase pré-escolar, segundo sua própria descrição. Trata-se do FunToyzCollector, antes chamado de DisneyCollectorBR, figura constante nas listas de mais vistos no YouTube. Hoje, ele tem 5,1 milhões de assinantes e mais de 7,6 bilhões de visualizações.

O canal apresenta, em suas palavras, resenhas de brinquedos variados e até de surpresas do chocolate Kinder Ovo. Segundo estimativas do site SocialBlade, que analisa o YouTube, seus ganhos mensais, obtidos pelas propagandas e banners nos vídeos, ficam entre US$ 77,7 mil e US$ 1,2 milhão.

DESEMPACOTANDO NO BRASIL

Não há na pesquisa do Google dados específicos sobre o Brasil, mas a febre também já chegou aqui. O canal Brinquedos & Bonecas Surpresa, por exemplo, com um desenho da porquinha Peppa no avatar, foi criado em março deste ano e tem cerca de 198 mil assinantes e mais de 129 milhões de visualizações. Em sua descrição, diz ter como público “bebês, meninos, meninas e crianças pré-escolares”. Uma mulher com voz infantil abre as caixas mostrando as unhas pintadas com desenhos do Mickey e expõe tudo o que está ali dentro, citando as marcas dos produtos.

Outro canal, o DisneyTopToys Tototoykids, segue a mesma linha. “Somos um canal que diverte e encanta as crianças com novelinhas e novos brinquedos. Abrimos os brinquedos (playsets) mais LEGAIS do momento”, anuncia. São 385 mil assinantes e 306 milhões de visualizações em vídeos que começam com um “venha se divertir com a gente!”. Neles, um casal começa a brincar com bonecos como fazem crianças, criando diferentes vozes e histórias para os personagens.

MAIS: Assine a Newsletter do Risca Faca!

Gustavo Machado, um dos criadores do canal Brinquedos e Brincadeiras — Toys and Fun — criado em maio, com 6,4 mil assinantes e 2,5 milhões de visualizações — diz encarar o projeto como um negócio. “Realizamos alguns estudos de caso e fizemos um planejamento a médio e longo prazo para retorno do investimento. Após um mês de estudos decidimos colocar o canal no ar, no final de maio”, conta.

“Somos o único canal de brinquedos a utilizar multi-câmera nos vídeos, em alguns deles além das duas câmeras normais utilizamos também uma GoPro, e isso acaba refletindo no tempo de edição e renderização dos vídeos, o que faz com que o tempo total de produção ultrapasse seis horas facilmente em alguns casos”, diz. “A nossa meta é lançar um vídeo por dia de segunda a sábado.”

Para ele, as crianças se sentem dentro da brincadeira ao verem os vídeos de “unboxing”, mesmo que não tenham os produtos em mãos — todos comprados por eles, nenhum presente de marcas. “Escolhemos os brinquedos baseados em personagens que fazem sucesso com as crianças, filmes recém-lançados e também dados que extraímos da ferramenta de análise de audiência que o YouTube disponibiliza”, conta.

Machado concorda que esse tipo de vídeo pode ser considerado uma forma de propaganda. “Com certeza as crianças acabam sendo estimuladas a realizar a compra. Percebemos isso, pois recebemos seguidamente comentários em nossos vídeos de crianças questionando onde adquirimos os brinquedos e o preço deles.”

Já um dos donos do canal Brinquedos & Bonecas Surpresa — seu nome e seu rosto não aparecem nos vídeos — discorda. Ele diz não acreditar que os vídeos de “unboxing” façam propaganda indireta e que na maioria das vezes as crianças assistem a eles acompanhadas de seus pais.

Também afirma não ter relação alguma com marcas. “Compramos 99,99…% dos nossos brinquedos. Apenas quatro foram enviados por uma marca e gravamos apenas dois. Não me pagaram para gravar. Deixo claro: se quiser enviar, envie, mas não forneço nenhuma garantia de que iremos gravar o brinquedo.”

CLANDESTINA

Nos Estados Unidos, as organizações Commercial-Free Childhood (Infância Livre de Comerciais) e Center for Digital Democracy (Centro para a Democracia Digital) protestaram, pedindo em maio para que o YouTube coloque um rótulo de propaganda em alguns vídeos de “unboxing”. No texto, dizem que muitos dos vídeos gerados por usuários têm acordos não revelados com marcas, citando cinco canais do YouTube que têm afiliação com o Maker Studios, da Disney.

Segundo Isabella Henriques, diretora de defesa do Instituto Alana, organização que defende direitos das crianças, os vídeos de “unboxing” são “verdadeiras publicidades clandestinas, que não se apresentam como publicidades, mas são pensados pelas marcas como comunicação mercadológica, decorrentes de uma estratégia pensada e planejada para atingir, especialmente, as crianças”.

Se o conteúdo aparece misturado com a publicidade, como no caso desses vídeos, é mais difícil para a criança identificar a mensagem publicitária. “Dependendo da idade das crianças será mesmo impossível fazer essa análise, entender que se trata de publicidade”, afirma.

Henriques diz que, até os oito anos, crianças têm dificuldade em identificar as mensagens publicitárias como tal e separar o entretenimento da propaganda. A partir dessa idade, conseguem fazer essa distinção, mas não entendem que a publicidade nem sempre diz a verdade e que seu objetivo é persuadi-las a consumir.

Screen Shot 2015-08-27 at 4.36.44 PM

O professor do Instituto de Psicologia da USP (Universidade de São Paulo) Yves de La Taille concorda que crianças, até os 12 anos de idade, não conseguem olhar criticamente para os anúncios, e que o fato de não haver uma separação clara entre publicidade e conteúdo dificulta ainda mais essa compreensão. Ele cita o caso da França, por exemplo, em que antes dos intervalos comerciais na televisão há um aviso de que o que se segue é publicidade.

No caso dos vídeos de “unboxing”, se a marca do brinquedo é mencionada, o psicólogo afirma que deve-se considerar, sim, que são uma forma de publicidade clandestina, já que estimulam a vontade da criança de comprar o produto.

Para Livia Cattaruzzi, advogada do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), o problema não é anunciar produtos para crianças, como brinquedos. A propaganda deve, contudo, ser direcionada aos pais. Vídeos que utilizem elementos com apelo para crianças, como cores vibrantes, personagens de animações ou vozes infantilizadas, tais como nos vídeos de “unboxing”, constituem publicidade abusiva.

Segundo ela, as crianças têm inclusive o poder de influenciar as compras da família. Se uma marca de tinta, por exemplo, utiliza um personagem de desenho animado em suas propagandas, crianças pedem para os pais que comprem dessa marca, ainda que o produto não seja para elas. Pais que sentirem que alguma publicidade é abusiva devem procurar o Procon local, afirma Cattaruzzi.

Em relação a colocar um aviso de propaganda nos vídeos de “unboxing” do YouTube, como se pede nos Estados Unidos, Cattaruzzi e Isabella Henriques concordam que ao menos eles deixariam de ser publicidade clandestina. “Isso porque, nos termos do artigo 36 do Código de Defesa do Consumidor, a publicidade deve ser facilmente identificável como tal pelo público ao qual se dirige”, diz Henriques. “Mas no caso das crianças menores, que não sabem ler e que têm dificuldade de entender a publicidade como mensagem comercial, não resolveria”, ressalva.

Vanessa Anacleto, do Movimento Infância Livre de Consumismo (Milc) — grupo criado em 2012 que faz campanhas sobre os riscos da exposição precoce às telas e à publicidade –, diz que a iniciativa dos pais americanos é positiva, já que a internet é território livre para a propaganda. No entanto, ressalva que ainda se engatinha no Brasil no que diz respeito à regulação da publicidade infantil.

“A Resolução 163 do Conanda, editada no ano passado, nem sequer é levada a sério pelo mercado. Projetos de lei em tramitação na Câmara dos Deputados se arrastam durante anos sem chegarem à fase de votação”, afirma. Embora a resolução do Conanda tenha força normativa, ainda há projetos de lei sobre o tema no Congresso. Qualquer texto aprovado, porém, deve proteger ainda mais os direitos das crianças.

Em tempos de menos programas para elas na televisão, a tendência é que crianças encontrem cada vez mais seu entretenimento na internet. Embora seja mais trabalhoso fiscalizar os abusos lá, onde o conteúdo é produzido por usuários do mundo todo e se renova todos os dias, as regras são claras: “São as mesmas daquelas que valem para os outros canais de comunicação”, diz Isabella Henriques. “Não é necessariamente mais difícil de regulamentar.”

Categorias
Comportamento

Toda nudez será libertada

Até hoje Emma Holten não sabe como nem por que aconteceu. Quatro anos atrás, alguém entrou em seu e-mail, pegou fotos em que ela aparecia nua e as publicou na internet, com seu endereço, número de telefone e nome de seus familiares. É difícil explicar a sensação que teve, conta. “É como perguntar a um paciente de câncer como ele se sentiu quando ouviu que estava doente. Você não sabe o que vai acontecer, como isso vai afetar sua vida, por quanto tempo, ou o que vai significar.”

Emma, 24, atribuiu então seu próprio significado ao que tinha lhe acontecido. Procurou uma amiga, Cecilie Bødker, com uma ideia: usar a mesma nudez que tinha a transformado em vítima para afirmar ao mundo que aquele corpo era dela e que ela, Emma Holten, era sujeito e não objeto.

Nas imagens de Cecilie, a dinamarquesa Emma aparece sorridente, sem retoques, em situações cotidianas. “São fotos de como uma mulher se vê: um ser humano com uma história e com um corpo que lhe pertence.”

O projeto, intitulado “Consent” (consentimento), não é o único do gênero. Há outras mulheres, vítimas ou não de pornografia não-consensual, publicando seus “nudes” em sites e redes sociais como Tumblr e Instagram para discutir questões de gênero ou simplesmente porque podem e querem fazê-lo, sob suas condições.

Foto do projeto “Consent”, de Emma Holten.
Foto do projeto “Consent”, de Emma Holten.

No caso de Emma, que passou a dar palestras e escrever artigos sobre feminismo, a motivação foi o descontentamento com as discussões sobre pornografia não consensual. “Eram machistas e degradantes às vítimas. Nos chamavam de ingênuas, nunca deixavam que a gente falasse. E faziam parecer como se a gente se arrependesse de ter tirado as fotos.”

Seu objetivo era mostrar que ela era humana, embora estivessem tirando a humanidade de seu corpo. “Pensei que, com todos os privilégios que tenho, apesar do meu sofrimento, eu deveria ser a pessoa de quem eu precisava quando isso me aconteceu. Uma pessoa que mostra respeito às vítimas.”

Quando suas fotos roubadas chegaram à internet, Emma foi alvo de mensagens raivosas. “Homens diziam que eu era tão nojenta que deveria me matar. E alguns pareciam muito fascinados com a vergonha sexual nelas. Perguntavam se minha família sabia, por exemplo.”

A explicação para os porquês desse comportamento não é simples. Para ela, a indústria do entretenimento deixa muitas vezes o espectador decidir o que o corpo da mulher significa, tirando sua agência. A mídia também tem sua parcela de culpa, diz. “Na maior parte das entrevistas me pedem para discutir intimamente minha sexualidade, meu relacionamento com meu corpo e com outras pessoas, mesmo que seja irrelevante para meu ativismo e para as vítimas. Amamos ouvir sobre a vergonha sexual e o sofrimento das mulheres.”

Muitas pessoas lhe disseram que publicar seus próprios “nudes” era se expor ainda mais do que tinha sido exposta quando as fotos vazaram. Emma discorda. “Isso me assustou tanto. Tantas pessoas não viram a diferença entre algo que escolhi e algo que foi feito contra minha vontade. Isso me mostrou que o projeto era importante.”

Posar nua para Cecilie foi tranquilo e emancipador. “Senti que tinha tomado uma decisão para mim pela primeira vez em muito tempo”, lembra. Considera-se otimista, vendo outros projetos como o seu por aí. “Acredito que as coisas estão acontecendo. Mulheres pelo mundo todo estão cansadas de serem desumanizadas. Estamos lutando de volta. Sinto muito orgulho em ser parte disso.”

Outra participante da batalha é a fotógrafa britânica Nadia Lee Cohen, que, diferente de Emma não foi vítima de pornografia não consensual. O discurso por trás de seu projeto “100 Naked Women” (cem mulheres nuas), contudo, é semelhante ao da dinamarquesa. Ao site inglês “Metro” Nadia disse que a ideia de retratar nus femininos veio de sua insatisfação com o retrato “pouco realista” das fotos habituais do gênero. “Fui fotografada nua no passado e descobri que é curiosamente libertador, e quis oferecer a mesma experiência para outras mulheres.”

No Brasil, há um projeto artístico parecido, chamado “A Olho Nu”, mas liderado por um homem, o fotógrafo Pedrinho Fonseca. Em seu site, as imagens são acompanhadas por textos nos quais as fotografadas dividem suas histórias, desejos e aflições.

Unknown-3
Isabela Testi clicada por Pedrinho Fonseca no projeto “A Olho Nu”

Alguns percalços apareceram no caminho. Uma das participantes do ensaio desistiu da sessão de fotos após ser impedida pelo namorado, que escreveu um e-mail a Fonseca lhe perguntando “e se fosse a sua mulher?”. O fotógrafo utilizou outro de seus projetos, o “Do Seu Pai”, no qual escreve cartas para seus filhos lerem no futuro, para explicar seu intuito.

“Estou fazendo um trabalho, filha, fotografando nus femininos. Um registro de mulheres que têm algo relevante a dizer e que através da sua voz e do seu corpo delimitam a fronteira invisível do respeito”, escreveu. “Ao ouvi-las, entendo em que momento da vida estão e – agora sim o intuito final do projeto – que mulher é essa que, em 2015, caminha para o futuro. Saber que lugar é esse que elas querem chegar.”

E completou: “JAMAIS deixe um homem pensar que ele é dono do seu corpo. JAMAIS. Seu corpo, esse presente que o Universo deu, é só seu. Faça com esse corpo o que VOCÊ MESMA quiser”.

OS POLÊMICOS MAMILOS
Embora os “nudes” femininos publicados voluntariamente sejam mais comuns hoje, a nudez ainda é tabu e parte de uma questão política. Diretora do filme “Free the Nipple” (liberte o mamilo) e líder de campanha homônima, a americana Lina Esco tem como principal bandeira fazer com que, como os homens, as mulheres possam andar sem camisa quando quiserem. Isso é permitido pela lei em Nova York, por exemplo, embora na prática um topless ainda leva uma mulher à cadeia.

Os peitos, no caso, são um símbolo de uma questão mais ampla, esclarece. Seu movimento, que tem adeptos como Miley Cyrus e Rihanna, luta pela igualdade e pelo empoderamento feminino mundo afora.

“Muita gente não sabe, mas antes de 1934 era ilegal para homens ficarem sem camisa [nos Estados Unidos]. Mas eles lutaram contra a lei e isso foi normalizado. Agora vemos homens assim e não surtamos”, diz. “Há cem anos os tornozelos eram considerados obscenos. É assim que lembraremos dos mamilos, pode escrever.”

Para ela, acostumar as pessoas a ver seios contribui para tirar a imagem sexual de torno deles. E dá um exemplo prático. “Um cara me disse que se eu quisesse mostrar os peitos ele não poderia deixar de pensar em sexo.” Ela o questionou de volta: e se eles conversassem assim por cinco horas? Ele não iria se acostumar? A resposta foi sim.

Em Nova York mulheres podem, legalmente, ficar de topless. Na prática, porém, não funciona assim. Enquanto Lina filmava, policiais pediram repetidas vezes a ela que colocasse a blusa. As denúncias muitas vezes vinham de mães. “Elas amamentaram os filhos, o peito deu comida a eles. Por que elas fazem mulheres se envergonharem? Não entendo”, diz.

“Você pode sexualizar seus peitos, objetificá-los, mas no momento em que você começa a usá-los como se fossem seus, é condenada. É uma questão de igualdade”, opina. “Quem diria que o mamilo ia ser o cavalo de Troia nessa discussão? Se eu fizesse um movimento chamado apenas igualdade ninguém falaria sobre ele”, ri.

Unknown-2

Falando do Brasil, Joana Novaes, psicoterapeuta e coordenadora do núcleo de doenças da beleza da PUC- Rio, diz que o país é “absolutamente paradoxal”. Enquanto existe uma superexposição dos corpos e biquínis mínimos, a nudez não é encarada com naturalidade. “Há uma falsa liberalidade nos costumes e um extremo conservadorismo na mentalidade, na forma como se encara a sexualidade.”

“Um país em que crescem as cirurgias íntimas é extremamente machista. É uma forma inegável de aprisionamento desse corpo [feminino] ”, continua, “Os adventos feministas em muitos aspectos não alcançaram suas conquistas. A mulher não é dona desse corpo. Ela ainda é o corpo.”

E, falando da pauta de Lina: por que um topless feminino ainda é um escândalo enquanto homens podem circular sem camisa por aí? “O homem não amamenta, para início de conversa. Seu peitoral não é sagrado. Em termos de socialização, ele não é criado para ser pai. Já o papel da mulher ainda está muito associado ao universo doméstico”, opina. “O corpo dela é propriedade de alguém, por isso não deve ser exposto publicamente, enquanto o homem pertence a si mesmo. Então o peito dele não significa absolutamente nada.”

PORNÔ DE VINGANÇA
Os mesmos “nudes” usados hoje como forma de dar poder às mulheres foram utilizados como forma de humilhação se alastraram na internet anos atrás. A disseminação de câmeras em celulares e a popularização do “sexting” — troca de conteúdo erótico via mensagens — tornaram possível que fotos e vídeos íntimos fossem publicados sem consentimento do retratado, caso de Emma Holten.

Segundo dados da ONG Safernet, o número de casos registrados de vazamentos de “nudes” quadruplicou em dois anos no Brasil. No ano passado, 224 pessoas procuraram o serviço da organização de defesa de direitos humanos na internet. Em 2012, o número era de 48. As mulheres representam 81% das denúncias.

Para Emma Holten, o fato de suas fotos terem sido divulgadas sem sua autorização era o principal atrativo para os homens que as compartilhavam. Se fosse uma modelo posando nua para uma campanha, compara, o interesse seria menor.

É o drama que envolve o vazamento de “nudes” que fisga as pessoas, segundo a psicóloga Ana Canosa. “Não é só a foto que conta, mas sua história. Principalmente se ela, no campo amoroso, trata de assuntos delicados como traições, vinganças e práticas sexuais não usuais”, diz. “Além disso, com tanta exposição de intimidade no espaço público, revelar, sem autorização, o que ainda é privado está virando um ‘fetiche’ social.”

“Infelizmente, no Brasil, ser mulher, autônoma e dona de seu desejo e destino é uma grande ameaça.” Ana Canosa, psicóloga

No espaço anônimo da internet, as pessoas ainda se sentem mais à vontade para destilar sua raiva, xingando e ameaçando as vítimas da pornografia não consensual.

“Infelizmente, no Brasil, ser mulher, autônoma e dona de seu desejo e destino é uma grande ameaça. Veja a história: a mulher sempre é culpada por tudo”, afirma Ana. “Se o homem trai, a culpa é da mulher, que não transa, ou está gorda. Ou a culpa é da outra que se ‘jogou’ em cima do cara casado.” Para ela, a exploração da nudez da mulher é uma construção cultural. “É só comparar a quantidade de nu feminino com a de masculino na mídia.”

Nos Estados Unidos, a campanha End Revenge Porn (termine a pornografia de vingança) dá suporte às vítimas de pornografia não consensual. Criada em 2012 com o objetivo de fazer uma petição em prol de leis contra essa prática, acabou crescendo. Hoje permite que vítimas conversem umas com as outras e obtenham orientação legal de como proceder. “Trabalhamos com milhares de vítimas globalmente e somos uma força para inovação tecnológica, social e legislativa na luta contra pornografia não consensual e abuso virtual”, diz a advogada Carrie Goldberg.

Após um escândalo no ano passado, quando imagens de celebridades como Jennifer Lawrence e Kate Upton foram publicadas na internet, o Google anunciou que irá tirar de seu mecanismo de busca imagens de pornografia não consensual se houver pedido das vítimas.

“Imagens de vingança pornô são muito pessoais, emocionalmente traumáticas e só servem para humilhar as vítimas — na maioria das vezes, mulheres”, afirmou em comunicado oficial em junho deste ano Amit Singhal, vice-presidente de busca do Google. “Sabemos que isso não vai resolver o problema do pornô de vingança — nós não conseguimos, por exemplo, remover esses conteúdos dos sites, apenas da busca–, porém, esperamos que ao atender os pedidos de remoção das pessoas nós possamos ajudá-las.”

“Essa decisão é um passo tremendo para todos nós”, diz Emma Holten. “Sempre haverá ex-namorados irados, hackers e misóginos. O que podemos fazer é limitar os danos uma vez que a violação acontecer. É aí que grandes sites podem ajudar.”

Carrie Goldberg concorda. “Um dos danos mais duradouros da pornografia de vingança é o na reputação causado pelo fato de que essas imagens aparecem sempre que alguém procura o nome da vítima no Google. Hoje em dia ninguém namora, contrata ou mesmo fica amiga de alguém sem consultar os mecanismos de busca na internet”, avalia.

Em sua opinião, as empresas tecnológicas deveriam desenvolver práticas que controlem os abusos, caso do Twitter, que pune pessoas que desrespeitem suas regras. “As novas empresas de tecnologia que entram no mercado devem antecipar as formas pelas quais o abuso pode acontecer em seu produto e incorporar soluções para lidar com isso.”

Nos Estados Unidos, 25 Estados aprovaram leis criminais contra a pornografia não consensual. Como Emma e Lina, Carrie é otimista, mas diz que sua luta está longe do fim. “Estamos esperando a introdução de uma lei federal nos Estados Unidos”, diz. “Vamos continuar na cruzada para que a internet respeite os códigos de conduta que são esperados offline, especialmente quando se refere a consentimento, abuso e privacidade.”