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Cinema

A sensível ficção científica de
‘A Chegada’

Uma conversa sobre a ficção científica que é um dos melhores filmes do ano.

Quer dizer que “A Chegada” estreia na quinta (24)? Mais um ano, mais um grande filme de ficção científica sobre o espaço.
Verdade, mas não dá pra gente reclamar muito, né. No ano passado, “Perdido em Marte” foi uma ótima surpresa e conseguiu até se infiltrar no Oscar deste ano. Dá pra dizer o mesmo de “A Chegada”, do Denis Villeneuve: é um dos melhores filmes do ano e não lembra em nada os últimos filmes com uma temática parecida. Aliás, dizer que esse é um filme sobre o espaço não é certo. Sim, uma parte fundamental do enredo é a chegada de alienígenas na Terra, mas é mais um filme sobre comunicação, sobre entendimento.

E quem é esse diretor mesmo, o Denis Villeneuve?
Villeneuve é um diretor canadense que tem ganhado cada vez mais fama por fazer filmes de suspense com uma velocidade reduzida, trilhas sonoras potentes misturadas com silêncios marcantes, criando um ambiente tenso em todas as suas obras. Um de seus primeiros filmes, “Incêndios”, foi indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro. Assim como em “A Chegada”, é difícil detalhar os filmes de Villeneuve sem entregar pontos-chave de cada um deles: é prazeroso vê-los sem ter muitos detalhes sobre a história e se surpreender com o roteiro. Isso funciona muito bem em “Os Suspeitos” e “Sicario: Terra de Ninguém”. E espere ouvir mais ainda o nome dele no ano que vem, já que o diretor está filmando a sequência do clássico “Blade Runner”.

Ok, vamos voltar para “A Chegada”, então. Qual é a história?
O filme começa com a chegada de 12 naves de extraterrestres, que pousam em diferentes pontos da Terra: na China, nos Estados Unidos, em Serra Leoa… As naves são habitadas por criaturas que em nada lembram a imagem clássica que temos de ETs. Não são humanos verdes, e sim enormes criaturas escuras, sem rosto, com múltiplas pernas. Para descobrir o que esses alienígenas querem — se vieram em paz, ou se são uma ameaça –, cada país recruta uma equipe de cientistas responsável por tentar estabelecer um diálogo com eles. Nos Estados Unidos, eles chamam a linguista Louise Banks.

É o papel da Amy Adams, certo?
Isso mesmo. Ela e o físico Ian Donnelly, papel do Jeremy Renner, encabeçam uma missão para tentar se comunicar com os visitantes e conseguir a resposta para uma pergunta: qual é o seu propósito na Terra? O filme mostra o processo de Louise para conseguir decifrar aquilo que os aliens querem dizer. Como fazer para entender alguém que não fala sua língua, não escreve como você, não pensa da mesma forma e não tem as mesmas referências?

Mas eu vou me interessar por esse filme se eu não tiver nenhum conhecimento ou interesse por linguística?
Sim. Conhecimento de linguística é completamente dispensável, porque o filme é bem didático. Como Louise tem que explicar o que está fazendo para os militares leigos no assunto, o público também segue seus passos direitinho. É bem legal ver como ela faz para tentar falar com eles, começando por ideias bem básicas, como apresentar seu nome e dizer a eles que é humana. E apesar de ser um filme baseado em ciência real, é uma ficção científica, bem pouco previsível. Enquanto Louise tenta concluir sua missão — antes que o desespero dos humanos resulte em um ataque aos aliens e em uma possível retaliação –, vemos pequenos trechos de sua vida fora dali e a relação com a filha, que ficou doente. Não espere um filme de ficção cheio de cenas de ação, daqueles que só vale a pena assistir no cinema.

O visual não é grandes coisas, então?
Pelo contrário, é um filme muito bonito. Desde as naves espaciais, num formato meio ovalado, simples, até os reflexos nas roupas espaciais dos protagonistas, passando pelos símbolos de escrita alienígenas, circulares, tudo é muito bem pensado. Só não é um filme em que o visual importe mais do que o conteúdo. Como eu disse no começo, é uma história sobre como nos comunicamos, e sobre os riscos que existem na falta de diálogo — no caso do filme, se todas as nações não cooperarem, e se os humanos não conseguirem falar com os alienígenas, uma grande guerra pode acontecer. É uma ficção científica, sim, você pode esperar as clássicas cenas sem gravidade, mas o que interessa é a história — baseada no conto “Story of your Life”, de Ted Chiang, publicado em 1998 e vencedor de vários prêmios de ficção. Para adaptar o conto, que parecia inadaptável, com suas variações temporais e conceitos científicos complexos, foram seis anos de trabalho e um acompanhamento de Chiang. Deu certo.

E as atuações? Já está na hora de a Amy Adams ganhar um Oscar depois de cinco indicações, né. Até o Leonardo DiCaprio conseguiu o dele.
Provavelmente não será por esse filme, o que é uma pena, porque ela foi feita para esse papel. É uma atuação bem minimalista: ela não tem grandes cenas de choro, monólogos de impacto nem nada do gênero. Mas ela consegue transmitir muita coisa com poucas palavras (no outro filme dela que estreia neste ano, “Animais Noturnos”, ela passa boa parte do tempo lendo sozinha). Jeremy Renner também está bem simpático e faz bem o papel de coadjuvante — o resto dos atores tem menos impacto, o filme é quase todo de Amy Adams.

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